Política de acesso ao acervo
Regras para acesso ao acervo físico da Casa Zuzu Angel/Museu da Moda
quinta-feira, junho 29, 2017
“Quem é essa mulher / que canta sempre esse estribilho / só queria embalar meu filho / que mora na escuridão do mar / Quem é essa mulher / que canta sempre esse lamento / só queria lembrar o tormento / que fez o meu filho suspirar / Quem é essa mulher / que canta sempre o mesmo arranjo / só queria agasalhar meu anjo / e deixar seu corpo descansar / Quem é essa mulher / que canta como dobra um sino / queria cantar por meu menino / que ele já não pode mais cantar”
Esta é a letra da música “Angélica”, que Chico Buarque compôs com Miltinho, para a estilista Zuzu Angel, um ano após sua morte. Zuzu ficou conhecida por ser a primeira estilista (na época era intitulada figurinista) a levar suas criações para desfilar em Nova Iorque. Além disso, lutou bravamente contra a ditadura brasileira, a fim de denunciar a morte, tortura e ocultação do cadáver de seu filho, Stuart Edgar Angel Jones.
Zuleika Angel Jones nasceu Zuleika de Souza Netto, na cidade de Curvelo, Minas Gerais, em 1921. Mudou-se para Belo Horizonte ainda menina. Em seguida para Salvador, Bahia, onde em 1945 nasceu seu filho, Stuart. Mais tarde, em 1947, foi morar no Rio de Janeiro, onde nasceram as filhas Ana Cristina, em 1947, e Hildegard Beatriz, em 1949, aí permanecendo até sua morte, em 1976. Muito antes de nomes como os dos também brasileiros Francisco Costa ou Alexandre Herchcovich fazerem sucesso no exterior, Zuzu já conquistava páginas inteiras de The New York Times e New York Post, sendo pioneira no ingresso no mercado norte-americano de moda, realizando desfiles com uma linguagem original brasileira. Lá fora suas roupas inspiraram importantes editoriais e vestiram atrizes hollywoodianas como Joan Crawford, Kim Novak e Liza Minnelli.
Nos anos 50, Zuzu lançou-se com suas saias, em atelier doméstico, em seu apartamento de Ipanema, onde recebeu a primeira cliente internacional: a estrela americana do filme Os Dez Mandamentos Yvonne de Carlo. Nessa época, ela vestia a corte dos Anos JK. Nos anos 60, Zuzu projetou-se como um nome da alta moda com sua casa-residência-atelier, também em Ipanema, na Rua NAscimento silva. Ali recebeu desde a primeira-dama dona Yolanda Costa e Silva até a a atriz americana Kim Novak, que posou descalça na entrada de sua garagem, à alta socieda brasileira, como a condessa Pereira Carneiro, dona do Jornal Brasil, Leda Collor de Mello, mãe do futuro Presidente da República, Fernando Collor de Mello, e a chamada "juventude dourada" da época, que adorava a modernidade das roupas de Zuzu. Nos anos 70, Zuzu Angel inaugurou sua loja no Leblon, onde ela unia a sociedade à contracultura, com visitantes como a modelo Elke Maravilha, a cantora Liza Minnelli, as atrizes Dina Sfat e Tereza Rachel, os parceiros Raul Seixas e Paulo Coelho e o artista plástico Valtércio Caldas, todos surgindo no panorama das artes brasileiras.
Zuzu foi pioneira em muitos sentidos, começou antes de outros costureiros a divulgar sua marca, colocando-a do lado de fora nas roupas. As figuras de anjos tornaram-se a sua marca registrada por representarem a imagem de seu filho, bem como seu nome. A originalidade de sua proposta de moda é devida a uma temática essencialmente brasileira, fazendo uso de cores tropicais e materiais brasileiros. Ela foi a primeira a utilizar na moda as pedras brasileiras, fragmentos de bambu, madeira e conchas. Dominava seu ofício. Começou como costureira sob medida, atendendo à clientela. Em seguida, assumiu-se “fashion designer”, importando o termo dos Estados Unidos e criando belíssimas e interessantes peças, com inspiração singular. Fez saias, xales e vestidos com panos de colchão, fitas de gorgorão, rendas do norte, chita, utilizando estampas de pássaros, frutos tropicais, flores e borboletas.
Zuzu Angel também quebrou padrões comportamentais, pois, em um momento de extremo medo ela protestou e se fez bandeira viva de contestação. Seu filho Stuart foi um desaparecido político da ditadura. Stuart foi preso em 14 de maio de 1971 e levado para a Base Aérea do Galeão, onde foi torturado e morto. Segundo o preso político Alex Polari de Alverga, eue foi arrastado no pátio daquela unidade militar e obrigado a aspirar os gases tóxicos do cano de descarga do jipe, o que provocou a sua morte, por asfixia, nu longo martírio noite adentro. Alex escreveu à Zuzu da prisão, logo após a morte de Stuart, relatando as torturas sofridas por Stuart. Este depoimento consta no vídeo “Sonia Morta e Viva” produzido e dirigido por Sérgio Waisman, em 1985. O Relatório da Comissão Nacional da Verdade - 2016 - confirma a versão do assassinato de Stuart , pela Aeronáuica, no Galeão.
Zuzu Angel foi a primeira estilista a realizar protesto político através da moda, lutando corajosamente para encontrar o corpo de seu filho. Frequentava julgamentos trajando roupa preta, um cinto cheio de crucifixos, véu negro e um anjo de biscuit pendurado no pescoço. Essas peças históricas emblemáticas de sua luta encontram-se em nosso acervo e aqui neste Portal. Ela externava sua denúncia através de seus figurinos e de suas criações.
Zuzu produziu a primeira coleção de moda de denúncia política da história da moda, usando estampas e silhuetas bélicas, em bordados suaves, quase infantis. Ela compareceu de luto fechado bem como suas filhas. As modelos também usavam faixa de luto nas roupas. Esse desfile foi apresentado em Nova Iorque, na residência do cônsul-geral do Brasil, Lauro Soutello Alves, em 1971, diante de toda a imprensa, norte-americanos e correspondentes estrangeiros. Esta foi uma ação política estratégica de Zuzu, que não poderia realizar evento com tal conteúdo noutro local, senão numa instalação diplomática brasileira, já que o Ato Institucional Nº 5, sancionado pela ditadura, punia com cassação, prisão ou, até mesmo, morte, quem criticasse o Governo brasileiro no exterior.
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